terça-feira, 30 de abril de 2013

A questão do Feriadão

O Brasil é o país dos feriados! Várias vezes já ouvi pessoas afirmando tal fato, até porque qualquer paralisação mexe com os setores que trabalham com produtividade. Os patrões, por exemplo, veem as longas folgas como fator de prejuízo, enquanto os trabalhadores são fãs incondicionais das paradas, pois apreciam ficar em casa, descansando “um pouquinho”, pois ninguém é de ferro e relaxar faz bem para o corpo e para o espírito, ou recebem horas extras caso trabalhem. Se formos comparar com as economias mais modernas, veremos que o Brasil nem tem tantos feriados nacionais (excluo aqui os estaduais e municipais). Levantamento do site feriados.net contabiliza que o Brasil tem oito dias de feriado nacional; enquanto a Alemanha tem nove; os Estados Unidos, dez; a Espanha, 11; a Argentina, 13; Portugal, 14; e Japão, 16. Além de menos feriados que os demais países, o brasileiro tem carga de trabalho maior do que de trabalhadores de outros países. “A carga de trabalho no Brasil é uma das mais elevadas no mundo. Nós temos uma jornada de 44 horas, que país civilizado nenhum do mundo tem praticado mais ”, destacou Evilásio Salvador, assessor de Política Fiscal e Orçamentária do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) . Portanto não custa fazer a sua análise e verificar o que deve ser modificado ou não. Desde o último dia 15 de novembro, data em que se comemora a Proclamação da República no Brasil, muita gente está curtindo seis dias de folga. Não digo que todos estão aproveitando porque ainda existem aqueles que não têm esta facilidade em suas vidas, olham até com algum ciúme os que não estão fazendo nada em suas vidas. Entretanto vale a pena refletirmos um pouco sobre os últimos dias, começando justamente pelos eventos que modificaram a história e o regime político do país. A monarquia brasileira teve seu início após a Independência do Brasil em relação a Portugal no dia 7 de setembro de 1822. Somando os dois governos imperiais e a Regência (1831-1840), vivemos sessenta e sete anos procurando uma afirmação como nação frente aos outros países americanos que já viviam a república, com seus problemas particulares é claro, alguns nem melhores ou piores que nós. De fato, ao chegarmos ao final da década de 1880, em um processo que já se arrastava há um bom tempo, o governo imperial de sua Majestade Dom Pedro II (permitam-me abreviar o nome, grande demais para caber em qualquer lugar...), já andava mal das pernas, sem prestígio algum frente às elites (que desde sempre apoiaram os governos, enquanto as outras classes só obedeciam a tudo), sem moral com os militares e sem forças para modificar qualquer panorama, ainda mais após a ratificação feita pela princesa Isabel em relação aos escravos. Exatamente, ela confirmou a liberdade que já vinha acontecendo em muitos lugares do país, o que não quer dizer que tal gesto deva ser diminuído, o que claramente desagradou aos grandes latifundiários, base da sociedade escravista, que passou a apoiar os ideais republicanos. Dezoito meses depois um golpe de estado promovido por militares e civis, deu fim ao Império brasileiro, confirmando a vitória do Partido Republicano sobre um governo que não possuía mais base alguma. Várias vezes já foi dito que não houve participação popular nos eventos citados, pois de acordo com Aristides Lobo (que após a proclamação foi Ministro do Interior por dois meses), “o povo assistiu àquilo bestializado, atônito, surpreso, sem conhecer o que significava” (sugiro a leitura do livro o Livro Os Bestializados, de José Murilo de Carvalho, para entender melhor o que digo)). Assim nasceu a República no Brasil e sobre “ela” falarei em outra oportunidade. Sobre o 19 de novembro, dia da Bandeira, ainda que não seja feriado, tem sua importância pois foi nesta data que ocorreu a instituição da bandeira nacional republicana em 1889, apenas quatro dias após a proclamação. Lembro-me que na minha infância (nasci durante a Ditadura Militar no Brasil) era comum cantarmos perfilados no pátio da escola o Hino Nacional e o Hino à Bandeira (Salve lindo pendão da esperança, salve símbolo augusto da paz...). Eu e os colegas enchíamos o peito para cantar, incentivados pelas professoras, numa demonstração clara de amor ao país, coisas daquela época de ufanismo sem medida. Guardadas as devidas proporções, é incrível a ignorância da juventude atual com relação a esta data. Por último chegamos ao dia 20 de novembro, feriado decretado deveras recentemente, a partir de 1999 no município do Rio de Janeiro, mais que já era comemorado desde o início da década de 1970. A data foi escolhida justamente por ter sido o dia em que Zumbi dos Palmares, símbolo da resistência negra ao regime escravocrata, foi assassinado, em 1695. Seu objetivo é fazer refletir sobre a inserção do negro na sociedade brasileira e sobre a questão da igualdade racial. Mesmo sem ser um feriado nacional, não custa lembrar que Zumbi, segundo a historiografia oficial, foi um grande líder do Quilombo de Palmares (era sobrinho de Ganga Zumba, outro líder local), que lutou pela liberdade e é visto como símbolo da luta travada pelos cativos na época do Brasil colonial. Particularmente, ainda que o governo adote a data como Dia Nacional da Consciência Negra, todos nós que somos descendentes das três etnias, branca, indígena e africana (e também dos asiáticos que vieram depois), devemos parar e pensar no verdadeiro significado da palavra Liberdade, algo que na correria do cotidiano de nossas vidas, pareça ser apenas algo a mais. E lá se vai mais um feriadão, que somente serve para descanso e curtição, jamais para a reflexão de qualquer fato. E confirmo isso com as palavras de um aluno meu que afirmou o seguinte: “Aí profê (sic), zumbi pra mim só aqueles dos filmes Resident Evil, que são maneiro prá”... (prefiro não repetir o adjetivo aqui, apesar de utilizá-lo também, principalmente para os metidos a engraçadinhos). Até a próxima.

O DIA 7 DE SETEMBRO NA HISTÓRIA

Sobre o 7 de setembro, Independência do Brasil. Vamos refletir um pouco este fato? O mês de setembro mal começa e imediatamente nos vemos diante da semana da independência, ainda destacada de alguma forma nos meios de comunicação, o que faz com que lembremos dos acontecimentos que levaram o então príncipe regente, D. Pedro de Alcântara, a quebrar o vínculo que unia o território brasileiro ao Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves (1815-1822), pondo fim a trezentos e vinte e dois anos de exploração. Este ano comemoram-se os 190 anos da Independência do Brasil, o que já me faz antever, se é que isso tem algum sentido, os festejos que certamente acontecerão em 2022, quanto celebraremos o bicentenário da independência. Veremos quando a data chegar! Como não podemos tratar os eventos históricos como fatos que se esgotam em si mesmos, vamos contextualizar a Independência do Brasil, levantando algumas questões interessantes. A história oficial (podemos também chamá-la de historiografia clássica do país) aponta o dia 7 de setembro de 1822 como o dia da Independência. Entretanto alguns historiadores modernos seguem uma linha diferente (e eu concordo), apontando o início do processo alguns anos antes, com a chegada da Família Real portuguesa ao Brasil em 1808, como consequência da Guerra Peninsular movida por Napoleão Bonaparte, que havia invadido Portugal (as tais Guerras Napoleônicas que também afetaram a Espanha) com um exército comandado pelo general Junot. Como a administração do reino português foi transferida para o Brasil, houve um raro caso de “inversão metropolitana”, pois o Brasil passava de mera colônia a sede do governo, exercendo as funções de metrópole, ou seja, o “aparelho de estatal português” passou a atuar a partir do Brasil. Em Portugal houve um grande descontentamento com tal situação, o que levou alguns anos depois a Revolução Liberal do Porto, em agosto de 1820, assunto que trataremos mais adiante. A chegada da família real portuguesa no Brasil marcou fortemente os destinos do Brasil. Pela primeira vez na história, um monarca europeu transferia a capital de seu governo para uma colônia. A escolta foi feita por navios ingleses e cerca de 10 mil pessoas fizeram a viagem que atravessou o oceano Atlântico (ainda hoje há uma divergência em relação ao número de pessoas que vieram realmente). Após vários inconvenientes durante a viagem, uma tempestade separou o comboio de embarcações, fazendo com que D. João e parte da comitiva aportassem primeiro na Bahia, enquanto outros barcos seguiam direto para o Rio de Janeiro. Os britânicos imaginavam que a proteção dada a Família Real e a defesa das terras portuguesas da invasão napoleônica lhes dariam vantagens econômicas em troca do apoio oferecido (e tinham razão). Em Salvador, D. João, orientado pelo economista Luz José da Silva Lisboa, constituiu a Carta Régia de 1808, formalizando a abertura dos portos a “todas as nações amigas” (leia-se corretamente: Inglaterra!). Com esta medida o antigo pacto colonial (que obrigava o Brasil a comercializar apenas com Lisboa, que detinha o monopólio da importação de matérias-primas) era formalmente extinto, o que deu uma outra dinâmica econômica a então colônia portuguesa. A partir de 1810 os Tratados de Aliança e Amizade e de Comércio e Navegação, fixaram interesses britânicos maiores junto ao mercado brasileiro, estabelecendo taxas alfandegárias preferenciais aos produtos ingleses (pois é, a exploração sempre aconteceu, caso ainda haja alguma dúvida). No ano de 1815 D. João elevou o Brasil à condição de Reino Unido de Portugal e Algarves e essa nova nomeação extinguiu politicamente a antiga condição colonial do Brasil. Em 20 de março de 1816 faleceu a rainha Dona Maria I, o que deu ao regente a condição de assumir “de fato” o trono português que ele já comandava desde 1799. Não demorou para que os lusitanos que permaneceram em Portugal se mostrassem cada vez mais descontentes com o “status” que o Brasil alcançava como sede administrativa do governo português. Por isso em 1820 um movimento revolucionário das cortes de Lisboa lutou pelo fim da condição política que deixava de Portugal em segundo plano. A chamada Revolução do Porto tratou de criar um governo provisório, exigindo o retorno imediato de Dom João VI à antiga metrópole lisboeta. Como o rei temia perder o seu poder, partiu para a Europa em 25 de abril de 1821, após treze anos morando aqui, não sem antes deixar seu filho primogênito, Dom Pedro, como príncipe regente do Brasil, com a seguinte recomendação: “Se o Brasil for se separar de Portugal, antes seja para ti, que me hás de respeitar, do que para algum desses aventureiros”. Acredito que D. João já antevia o que acabou realmente tornando-se verdade. Fez uma espécie de “arranjo” para o filho e impulsionou a ideia separatista. Os revolucionários, por sua vez, exigiram a volta do pacto colonial, o que significava a recolonização do Brasil, fazendo com que as repercussões desses acontecimentos fossem as mais negativas do lado de cá do Atlântico, o que não tardou a impulsionar formação de um movimento que influenciaria a independência do Brasil. Os deputados portugueses também fizeram chegar por aqui, em 9 de dezembro do mesmo ano, os decretos das Cortes que determinavam a abolição da Regência e o imediato retorno de D. Pedro de Alcântara a Portugal, a obediência das províncias a Lisboa (e não mais ao Rio de Janeiro) e a extinção dos tribunais do Rio de Janeiro. O Príncipe Regente até começou a preparar-se para o seu regresso, mas a partir daquele momento os fatos subsequentes trataram de dar novo rumo à história. O príncipe não só desobedeceu a ordem da Cortes, como também pronunciou a célebre frase “Se é para o bem de todos e felicidade geral da Nação, estou pronto. Digam ao povo que fico!”. O episódio tornou-se conhecido como “Dia do Fico”, o que atendia a um documento assinado por pessoas da elite brasileira (ninguém pode pensar que todos desejavam que o príncipe ficasse, uma vez que os pobres, indígenas, escravos e outros não participaram diretamente do evento, muito menos assinaram coisa alguma, pois faziam parte da grande massa de analfabetos existentes por aqui naquela época). Em agosto de 1822 D. Pedro foi à província de São Paulo com o intuito de dar fim a uma rebelião contra José Bonifácio de Andrada e Silva, que ocupava o cargo de ministro do Reino e dos Estrangeiros. Segundo alguns registros foi nesta época que ele conheceu uma de suas mais famosas amantes, Domitila de Castro do Canto e Melo (futura Marquesa de Santos a partir de 1826). No dia 7 de setembro, quando voltava de Santos, D. Pedro e demais membros da tropa apearam às margens do riacho do Ipiranga, quando duas correspondências enviadas por José Bonifácio e sua esposa, Maria Leopoldina aconselhavam-no a romper com Portugal. Devido a estas circunstâncias, já não desejando seguir quaisquer ordens vindas de Lisboa, D. Pedro, movido por um heroísmo sem limites (imortalizado no quadro do pintor Pedro Américo), proferiu a célebre frase “Independência ou Morte!”, rompendo os laços da já frágil união política do Brasil com Portugal. O longo processo da emancipação foi ratificado com a aclamação do príncipe como Imperador, com o título de D. Pedro I, defensor perpétuo do Brasil, sendo sagrado e coroado solenemente em 1º de dezembro de 1822. Muito bem, reconheço que a explanação foi longa, mas posso garantir que é “apenas” um resumo dos fatos. O caro leitor não pode pensar que acaba por aqui a bela história... Deixe-me contar alguns dos fatos posteriores à independência! O surgimento do Primeiro Reinado marcou decisivamente a renúncia da condição de colônia e a transformação do Brasil em uma nação politicamente soberana. Sabemos do significado histórico dessa mudança, porém nosso processo emancipatório não deu margem à conquista de outras alterações mais extensas e significativas. Não devemos esquecer que os privilégios das classes dominantes e a condição de miséria de todos os subordinados (aqueles que já citei) foram explicitamente preservados. A Assembleia Constituinte reuniu-se em 1823 e seu principal objetivo era a elaboração da primeira Constituição do Brasil, ou seja, as leis que assegurariam os direitos do governo e da população brasileira. Entretanto apenas os membros da elite (latifundiários, ricos comerciantes, militares e outros...) trabalharam na elaboração da Constituição de 1824. Essa constituição tinha um caráter elitista e excludente, pois dava total poder a D. Pedro I, enquanto o direito de votar e de se candidatar a algum cargo eletivo ficaria restrito a quem tivesse uma renda mínima por ano. Preciso dizer novamente que os pobres, indígenas, escravos e outros menos afortunados ficaram de fora? Se você disse sim, acertou em cheio. O que aconteceu na verdade foi uma independência sem muitas mudanças no quadro político e social do país. Daí para frente o Imperador apoiou-se em grandes empréstimos contraídos junto à Inglaterra para poder acertar as dispendiosas contas criadas pela máquina estatal brasileira, o que nos leva a conclusão que deixamos de ser dependentes de Portugal para ficarmos reféns dos interesses ingleses sobre a nova nação, situação que aliás entendeu-se ao longo do século XIX. A popularidade de D. Pedro I foi caindo com o passar dos anos, mesmo junto às elites que apoiaram seus atos no início do governo, culminando com sua abdicação em 1831, apenas nove anos depois da independência. Passados tantos anos, com o fim do império e início da República, depois de tantos problemas que enfrentamos em nossa história recente (ditadura militar, impeachment, neoliberalismo, mensalão, falência das principais bases socias e descrédito na classe política atual, só para citar alguns casos) eu pergunto a você: Podemos realmente comemorar uma independência verdadeira? Este é um país que honra seus compromissos sociais e morais? Somos nacionalistas de verdade ou apenas aproveitamos o feriado para descansar e viajar? Não bastam os desfiles militares para comemorarmos uma das datas nacionais mais importantes da nação brasileira, porque nem eu e nem ninguém que eu conheça agita a bandeira nacional no dia da pátria. Aliás, sobre o conceito de Nação e nacionalidade, melhor deixar para um futuro artigo. Por enquanto continuarei pensando apenas na “Independência do Brasil”...

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010





É tempo de descansar...

O tempo não dá descanso a ninguém, e muitas vezes reclamamos da falta dele para resolver os problemas de nosso dia a dia. Quem teve a oportunidade de ouvir a antiga programação da Rádio Relógio Federal, do Rio de Janeiro, sempre ouvia a seguinte frase: “A cada segundo que passa é um milagre que jamais se repete.” Os adultos vivem em função dele, já as crianças de colo, por exemplo, não tem a mínima noção de sua existência.

Começo este texto fazendo uma alusão ao tempo, porque agora, no final do ano, é tempo de descansar, para professores e alunos, uma vez que outras categorias não acompanham o calendário escolar. Depois de um ano inteiro com uma agenda lotada de compromissos, trabalho e estudo, chegam as férias de verão: um prêmio merecido para alunos, professores e toda a família. O recesso das aulas de fim de ano é o tradicional período de descanso, diversão e lazer. Esse é o tempo livre para fazer o que vier à cabeça, sem se preocupar com as obrigações do trabalho e da escola.

Algumas coisas já agendadas são postas em prática, como por exemplo aquela viagem já agendada, que servirá como um prêmio para aqueles que precisam “recarregar” as baterias após tantas preocupações. Há tantas coisas que podem ser feitas nas férias, mas as vezes nem nos damos conta de como vamos aproveitar tamanha oportunidade.

Quando olhamos para trás e fazemos uma pequena avaliação de tudo o que aconteceu, percebemos como a rotina e a correria do trabalho, dos estudos e a falta de tempo acabem distanciando as possibilidades de lazer, e por isso é necessário valorizar cada instante das férias.

Depois de passar um ano inteiro trabalhando ou estudando, é natural que qualquer pessoa esteja aguardando ansiosamente as tão sonhadas férias. Uma bela dica seria fazer com que o período de férias fosse dedicado a saúde, pois assim as pessoas poderiam gozá-las da melhor forma possível.

As férias são importantes para as crianças e adolescentes refazerem-se do estresse causado pelas atividades escolares, particularmente os exames de final de ano, sem esquecer dos vestibulares e do Enem, que tanta dor de cabeça vem trazendo para pais e filhos.

Outra coisa que jovens e adultos podem fazer nas férias é aumentar as chances de aprender muito sobre si mesmos, sobre as pessoas e sobre o mundo. É possível aproveitar e apreciar os momentos de convívio com os amigos e com a família. Enfim, é uma forma de relembrar que na vida há muito mais a fazer do que apenas trabalhar, estudar, ser responsável, etc.

As férias são merecidas por todos: os que foram aprovados e mesmo os que não foram. E este detalhe às vezes causa um impacto sobre o aluno e, consequentemente, sobre a família. Todos trabalharam o ano todo, fizeram os deveres, se empenharam. Alguns mais, outros menos. Por isso férias devem ser férias. Nada de fazer os filhos estudarem em pouco tempo o que não conseguiram durante o ano letivo.

As férias escolares, no Brasil, geralmente variam entre 90 e 120 dias, não consecutivos. Algumas escolas e universidades também consideram parte de fevereiro como período de férias. Para os estudantes da rede pública de ensino, o período de férias é de duas semanas em julho, duas semanas em dezembro e todo o mês de janeiro.

É hora do lazer! Vamos aproveitar porque, afinal de contas, é tempo de descansar...

domingo, 11 de julho de 2010

Por que estudar História?

Atualmente os desafios do professor em sala de aula aumentam cada vez mais. Vários motivos levam os profissionais de ensino a questionar o sistema e parece não haver solução a curto prazo.

Outro eu estava em sala de aula e alguns alunos questionaram o motivo de eles serem obrigados a estudar "História", essa "coisa" do passado, troço "antigo" não está com nada e outros adjetivos foram colocados para fora, como se fosse um desabafo, um cansaço com aquilo que eles chamaram de desnecessário...

Pacientemente ouvi tudo e depois tomeia a palavra, buscando conversar sobre o tema (já que a aula acabara de ficar de lado), procurando mostrar os motivos da existência dos professores de História e a necessidade de se estudar a referida disciplina.

Tradicionalmente, estudamos História para poder lidar com o passado, situar-se em seu espaço de identidade e no mundo em que vive.

A História está presente desde os primeiros momentos da nossa tradição ocidental. O esforço sistemático de compreensão racional do passado, resultando em uma obra escrita, remonta ao grego Heródoto, no século V a.C. No século XIX, com o desenvolvimento de vários instrumentos de pesquisa e de análise do documento, a História ganhou assumiu sua pretensão metódica de cientificidade.

Ao buscar estabelecer os fatores explicativos confiáveis da ação humana no passado, a História ganhou reconhecimento entre as chamadas Ciências Humanas e Sociais. Hoje em dia, a construção do saber histórico tem consciência das variáveis de sua produção, de que dependem a verdade e a objetividade sociais a que se candidata.

A História, por ser científica, dialoga com os demais campos do saber, como a Literatura, a Filosofia, a Política, a Antropologia, a Sociologia, o Direito, a Economia, pois o produto final do trabalho do historiador é um texto científico de múltiplas facetas, uma composição literária, em estilo que permita ser lido com prazer.

Ela pode ser recortada em diversos ângulos e em diversos períodos. Sem embargo, em todas permanece a matéria-prima básica do historiador: o tempo e a ação humana nele. Os ritmos das ações humanas no tempo não são uniformes. Há um tempo longo, sedimentado, cuja transformação é lenta, como o da geografia ou das mentalidades. Pode-se falar também de tempos intermediários, como os dos ciclos econômicos, dos regimes políticos, das organizações sociais.

Alguns sorrisos amarelos apareceram, falei inclusive que aquele momento de conversa sobreum assunto que não estava dentro do plano de aula daquele dia acabaria tornando-se parte da História deles. História da vida particular daquele grupo, não algo que passasse a ser discutido em livros.

Os desafios continuarão, mas quem sabe a atenção dos alunos se modifique aos poucos, afinal de contas são eles os futuros cidadãos deste país.

segunda-feira, 3 de maio de 2010

1º DE MAIO – PODEMOS COMEMORAR?




Os festejos relativos ao 1º de maio, dia o Dia do Trabalho ou Dia do Trabalhador, estão relacionados as conquistas dos trabalhadores durante um longo período da História. Desde o início do século XIX a historiografia nos mostra como os trabalhadores, após a Revolução Industrial, começaram a se engajar em movimentos que lutassem por seus direitos. Não podemos imaginar que tudo se deu sem luta, uma vez que as reações contra a jornada de trabalho (que em 1780 chegava a 80 horas por semana nas indústrias têxteis) eram sempre abafadas pelas autoridades.

A Revolução Industrial iniciou-se na Grã-Bretanha, no rastro das Revoluções Burguesas do século XVIII. Tais revoluções foram responsáveis pela crise no Antigo Regime e, posteriormente, pela passagem do capitalismo comercial para o industrial. Marx, ao teorizar sobre o fato, diria que o capitalismo era um produto da Revolução Industrial e não sua causa.

Em relação a população, a Revolução Industrial provocou mudanças profundas na vida do trabalhador rural, que migrou em massa para as grandes cidades, favorecendo o aparecimento de altas concentrações urbanas. Os operários viviam em condições desumanas, morando em cortiços, comendo mal e sujeitos a doenças, acumulando muitas horas de trabalho que não eram recompensadas de acordo com o volume de trabalho executado pelo operário.

A indignação com essa situação crescia de tal forma que surgiram movimentos em prol dos trabalhadores, como o Ludista (1811-1812, que ficou conhecido por invadir fábricas e quebrar máquinas) e o Cartista (1837-1848, que lutou pelos direitos políticos). A característica destes movimentos era a organização, fato que trouxe muitos benefícios para os trabalhadores.

Em 1889, no dia 20 de junho, a central sindical chamada Segunda Internacional, instituiu o 1º de maio como data maior dos trabalhadores organizados, entretanto somente em 1919 o senado francês proclamou a data como feriado nacional.

Depois da França, a Rússia foi o primeiro país a adotar a data comemorativa, em 1920. No Brasil a oficialização da data aconteceu em 1924 no governo de Artur Bernardes. Tempos depois, durante o primeiro governo de Getúlio Vargas, as principais medidas de benefício das classes proletárias passaram a ser anunciadas nesta data.

Atualmente o 1º de maio é visto pela maioria dos trabalhadores como dia de descanso. As manifestações de luta ficam restritas as centrais sindicais e aos partidos políticos, que junto a seus seguidores, promovem eventos em todo o país para convocar o trabalhador a refletir sobre as seus ideais e sobre como as coisas podem mudar para melhor em relação a jornada de trabalho. O próprio presidente Lula participou de um grande evento, em São Bernardo do Campo (SP), onde citou as conquistas dos trabalhadores e do país nos últimos anos, sempre com lembranças à situação anterior a seu governo.

Quem sabe um dia, após uma conscientização maior de todas as classes, poderemos pensar em um 1º de maio realmente dedicado ao trabalhador, aquele que realmente move o país em busca de dias melhores.

quarta-feira, 21 de abril de 2010

Rio de Janeiro, eterna capital do Brasil



A cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro já foi descrita por milhares de pessoas, cada qual com o seu ponto de vista. A maioria parece concordar que o título de “Cidade Maravilhosa” lhe cai bem, mesmo que ultimamente ela esteja sofrendo de problemas variados, ligados as mais diversas áreas, como por exemplo a política, a segurança e a saúde. Saudosistas poderiam passar horas perguntando se a situação da ex-capital sempre se apresentou desta maneira.

Agora vamos pensar no passado da cidade e imaginar como ela se comportou quando precisou ter sua estrutura transformada, deixando de lado os traços coloniais que ainda possuía. Este texto tem como objetivo estudar alguns aspectos importantes da história da cidade do Rio de Janeiro, que passou por profundas mudanças físicas e sociais a partir do final do século XIX e que ainda ecoam até nossos dias.

Tais modificações devem ser continuamente analisadas, tendo em vista que a moderna historiografia sempre se faz valer de novos olhares e novas pesquisas que surgem a partir revisões que vão sendo feitas sobre os mais diversos fatos. A partir de 1889, com a proclamação da República, o Rio de Janeiro torna-se a Capital Federal do então Estados Unidos do Brasil (o termo República Federativa viria muito mais tarde). Os primeiros tempos da República marcam a transição do país, que procurar cada vez mais de desvencilhar dos tempos da monarquia. O conceito chave destes primeiros tempos republicanos é a civilização, uma vez que o Rio de Janeiro ainda era uma cidade colonial, do ponto de vista estrutural. Tinha também um traço excessivamente popular (negros forros, refugiados de Canudos, imigrantes, além dos cortiços, animais perambulando pelas ruas), fato que dava a cidade uma má fama diante de outras capitais americanas e europeias. As primeiras tentativas de higienização aconteceram com as derrubadas dos cortiços, sendo o mais famosa deles o “Cabeça de Porco”.

O Rio de Janeiro passou a civilizar-se efetivamente a partir da presidência de Rodrigues Alves, que priorizou uma grande reforma na capital federal. O ponto central da reforma, para o governo federal, era a modernização do porto do Rio. Este fato favorecia os aos interesses do governo, visto que o Rio de Janeiro era a porta de exportação da produção cafeeira que vinha do interior de São Paulo, além de outros bens agrícolas que sustentavam a economia do país. A cidade também apresentava-se de forma pouco adequada devido as doenças endêmicas, ruas apertadas (o que dificultava a circulação de mercadorias) e sujeira em excesso. Rodrigues Alves desejava fazer, além de uma grande reforma, inspirada no padrão urbano europeu, a mudança no cotidiano de uma cidade que ainda estava longe de ser comparada à uma capital civilizada, pois a fama de cidade pestilenta prejudicava os negócios.

A pesquisa histórica, de acordo com o que se aprende com o movimento da Escola dos Annales, consiste num esforço de superação do evento. Portanto a reflexão sobre alguns fatos que levaram a transformação do Rio de Janeiro na capital da República que começava a dar seus primeiros passos nos permite conhecer algo mais sobre um período marcante na história da cidade e do país.

O Rio de Janeiro é uma cidade que parece ter sido destinada a ser diferente de todas as outras cidades brasileiras, quer seja pela sua localização e por suas belezas naturais, quer seja pelas particularidades que acabaram tornando-a uma das mais importantes dentro do cenário político, social e cultural do país. Todavia a cidade precisou pagar um preço alto para cumprir o papel que lhe era destinado, daí que quando se verificou a necessidade de modernizá-la. A Revolução Industrial estava acontecendo e trouxe mudanças significativas para toda a humanidade, dentre elas progresso, bem estar e modernidade. A cidade antiga aos poucos vai sendo deixada de lado para dar lugar a construção da cidade moderna. Os destroços vão servir para a construção das casas daqueles que foram desalojados do centro, o que sugere que houve uma lenta e contraditória construção de uma nova ordem. Porém não podemos ter idéia do que aconteceu, ou talvez o que tenha sido necessário acontecer, para a cidade chegar aonde se encontra hoje em dia.

A modernização trouxe uma série de inovações positivas, que muito alteraram o panorama existente na época, mesmo a custa de suprimir o passado e o atraso em relação a outras capitais européias. Diferentemente do velho mundo, onde muitas relíquias foram preservadas, o “bota-abaixo” arrasou muitas Igrejas e moradias antigas, o que refletia uma verdadeira rejeição ao passado colonial.

Reconstruir a cidade, da maneira como Pereira Passos fez, não se concentrava apenas em construir novas edificações no lugar daquelas que já existiam, mas sim trabalhar com uma renovação urbana que transformasse o espaço físico da cidade, visando alçá-la ao patamar das modernas cidades européias.

Podemos imaginar que tal quantidade de eventos transformadores não poderia passar ao largo das intervenções do povo, que rapidamente exerceu sua resistência ao que estava sendo modificado. O povo possuía seus costumes do dia-a-dia, fazia suas festas e tinha uma cultura popular que traduzia um verdadeiro chamado ao espírito carioca, único no país, que vive junto a este clima tropical durante o ano inteiro.

Comparar os tempos antigos com os atuais leva-nos a uma verdadeira viagem na história, lembrando também a necessidade de pensar no futuro, que pode ser a nova capital, Brasília, ou qualquer outra cidade. A urbanização que é imposta a cidade, com um olhar que evoca uma proposta arquitetônica arrojada e sem precedentes nas terras brasileiras é o que surge como novidade, uma vez que nada disso existia no Rio de Janeiro em 1903.

Uma das maiores preocupações de Pereira Passos era sanear a cidade, que tinha graves problemas relacionados à higiene, ligadas a moradia e ao trabalho. Estes itens afastavam os estrangeiros, portanto nada mais natural do partir para a solução dos problemas, pois para a administração tudo estava ainda com a marca do atraso. As demolições davam espaço para o novo, que surgia organizado e moderno. A principal preocupação era com o centro da cidade, que deveria refletir este novo aspecto não só para os habitantes, mas também para os viajantes que por aqui aportassem. Quem sabe Pereira Passos não tenha buscado sua inspiração na capital parisiense visando dar ao Rio de Janeiro um ar dos famosos boulevards franceses, fazendo por aqui uma Champs Elysées que viria a tomar o nome de Avenida Central.

A modernização da cidade inovou no urbano. Seu movimento inicial até foi conservador, mantendo os estilos arquitetônico do século XIX, porém inovou ao implantar um ecletismo, ao associar o estilo do prédio à sua função.

A cidade moderna faz surgir a necessidade de se trabalhar o urbanismo. Entretanto a topografia do Rio, as limitações do sistema de transportes e as características da demanda de serviços pessoais produziram o que poderíamos de um processo de favelização crescente.

A primeira reação para a modernização da cidade é a desordem capitalista coube aos higienistas e sanitarista; houve intensas migrações e a multiplicação de aglomerações residenciais. Os sanitaristas atribuíram aos miasmas a origem de epidemias variadas, o que aliás não era novidade na cidade, isto desde os tempos coloniais. Ao mesmo tempo em que se descobria a importância da água, do sistema de coleta de lixo e de padrões higiênicos de construção, dando importância às praias e ao mesmo tempo ao verde.

A República, que se encarregou de dar uma remodelada total na capital do país, transformou suas casas e ruas, mudou o comportamento da população, para o bem ou para o mal. Causou até uma revolta, a da vacina, que obrigava apenas os pobres moradores dos cortiços e favelas a serem inoculados. A classe rica não precisava de vacinação, sempre houve quem dissesse que uns poucos são melhores que a maioria.

A cidade antiga forneceu os alicerces para a construção da cidade moderna. Os mais pobres pegavam os entulhos para construírem casas nos morros, enquanto a nova cidade com suas largas avenidas, seus novos prédios e jardins, crescia, ainda que de forma contraditória, rumo ao futuro. No seu modernismo, a cidade inovou na parte urbanística, ainda que de forma conservadora no seu movimento inicial, de arquitetura renascentista.

A topografia deixa o Rio de Janeiro diferente das outras cidades em muitos aspectos, já que existe uma proximidade quase que natural entre o morro e o asfalto, facilitando de certa forma uma mistura que não se encontra em nenhum lugar. A favela próxima produz a mão-de-obra barata que serve de apoio as residências de renda mais elevada.

A figura do malandro, do mulato, do capoeira e dos habitantes dos cortiços, todas elas com uma carga negativa muito grande, ainda rende poesia, música e até filmes. O carioca já abrigou a corte portuguesa, já foi vizinho dos imperadores e de presidentes, distinção maior ainda não se conhece. Sua identificação e elegância, seu poder político, econômico e social já o diferenciou de todos os outros brasileiros, mais nem por isso tornou-o um “metido”. Os outros sempre vêem o carioca com maus olhos, porém, mesmo com tantos defeitos, o carioca é amável e acolhedor, sempre querendo conversar e mostrar como é bom viver perto do mar, do céu azul e da natureza, tendo o Cristo Redentor para abençoar todas as maravilhas que só o Rio de Janeiro tem para mostrar.

domingo, 11 de abril de 2010

A Construção do novo Mundo e o Imaginário Europeu



Se o outro nos parece estranho nos dias de hoje, que nos há de pensar em 1500?

Conceitos como o bem e o mal, o céu e a terra, Deus e o Diabo, paraíso e inferno, estavam bastante presentes na vida dos homens europeus do século XVI. A igreja e seus dogmas representavam um papel de extrema importância na cultura dessa sociedade, na qual, “pesavam sobre seus fardos” uma relação estreita para com Deus, intermediada pela “casta política da Igreja católica” cujo poder, enquanto instituição, transcendia a esfera do religioso. A tutela da igreja criava mecanismos de controle para esta sociedade fundamentada na recriação do imaginário europeu, instalando-se nas terras recém descobertas nas Américas.

O tempo cronológico desconhece as transformações culturais. O homem do século XVI estava mergulhado no que a Idade Média tinha de mais poderoso: “a cultura”. Homens detentores de conhecimento científico se rendiam às quimeras mitológicas que assombravam os imaginários. A Idade Média e a Idade Moderna não se rompiam nas grandes navegações, mas se confundiam nas práticas cotidianas, estranhando o que era diferente.

Se por um lado havia todo o aparato para promover a empresa comercial das grandes navegações, por outro havia um território novo, cheio de “mistérios”. A base para a construção da identidade de uma terra chamada Brasil começava a se fundamentar desta forma.

Portugal e Espanha, em particular, serão os alvos deste trabalho que buscará um entendimento mais abrangente sobre a “construção do novo mundo no imaginário europeu”. Partindo da tese de Laura de Mello e Souza, que ao abordar o tema, analisará relatos feitos por um cronista, que nem sempre esteve na colônia portuguesa das Américas, mas que só por ouvir certas histórias, criava uma pseudo – realidade a partir de estórias ratificadas pela Igreja. A reboque será feito um paralelo com alguns autores que em outras épocas discutiram sobre o assunto, onde se dialogará com algumas fontes.

Não se rompe com o passado da noite para o dia, nem tão pouco com antigos valores e práticas, parafraseando um ditado popular que diz : “o homem só encontra o que procura”. Os europeus em um primeiro momento, não encontraram nada que já não tivesse trazido da Europa. Em outras palavras, este pensamento vem confirmar a análise feita por Souza ao debruçar olhares sobre os trabalhos de Leopardi, quando ao falar do imaginário europeu, refere-se à incapacidade destes em reconhecer o outro.

A visão de céu e inferno criada por Frei Vicente ao explicar o processo de assimilação do nome Brasil, ao invés de terra de santa Cruz, pode explicar de forma sucinta como o europeu lidava com o que não lhe era conhecido. O mundo limitado passara a ganhar um novo formato. Caio Prado, em seus estudos, acreditava ser o Brasil uma cópia mal feita de Portugal, ao analisar questões como burocracia e colonização. É inegável parte de sua afirmação, pois aqueles homens não só eram produtos do seu tempo, como também de seu meio. Traziam toda uma bagagem, misturando-se a valores autóctones, criando assim uma organização diferente de todas as outras nas colônias.

O que se pode perceber a partir das leituras feitas no trabalho de Mello são dois pontos importantes, que servirão para explicar a colonização das terras recém descobertas nas Américas. O primeiro seria a possibilidade de extrair toda riqueza que estas terras pudessem prover. O segundo diz respeito a necessidade de civilizar esses nativos, ditos bárbaros, de costumes estranhos e que nunca tivera conhecimento da palavra de Deus. Havia aí a necessidade de levar a esses nativos o conhecimento da “verdade cristã”. Numa sociedade onde tudo se explicava pela relação com Deus, como era no século XVI, o que fugia a essa perspectiva só poderia ser explicado como sendo do Diabo.

A Terra de Santa Cruz, como fora batizada pelos portugueses quando aqui chegaram, era segundo Gandavo e Bradônio, de fauna abundante e de flora exuberante. Segundo a autora Brandônio, ao referir-se a Colônia portuguesa, esta era como sendo ao contrário dos “Campos Elíseos”, a verdadeira terra que corria leite.

Pelo menos durante todo século XVI e XVII, a visão “edênica” a respeito das terras descobertas foi predominante nas crônicas de viajantes, de escritores e também dos que, através destes trabalhos, procuravam divulgar as novas terras, a fim de criar um imaginário “especulativo e imobiliário”. Deus era o criador destas terras, então este seria o paraíso. Entretanto as crônicas de Jaboatão, no século XVIII, marcaram uma segunda fase a respeito desta visão de paraíso. Segundo a autora, o que se passou a ocorrer a partir do século XVIII foi uma negativa na forma de observar a Colônia de Portugal na América. A visão detratora passou a ser a outra fase do paraíso. Tudo que fugia a métrica européia de paraíso era então o inferno. Ao que parece os europeus trouxeram consigo este paradoxo. Mas a questão que se deve formular é quem começou a propagar tal fato? E sob quais questões a historiografia do século XVIII analisava tal efeito?

Apesar de acreditar que tal visão, (negação ao paraíso), teria sido influenciada pelo movimento Iluminista ocorrido na Europa, em particular, na França, este trabalho não se propõe discutir esta especificidade da história, ficando então para uma nova ordem, uma discussão poderá ir além das “espumas criadas pelas ondas ao bater nos rochedos”.

As práticas de antropofagismo indígena representavam uma enorme negativa, o que para alguns cronistas rompia com a visão edênica das terras recém-descobertas. Souza faz referencias a Navarro, Nóbrega, Jaboatão e Jerônimo Rodrigues , entre outros, que descrevem de forma bastante detalhada a “sede” dos índios por carne humana. Tais práticas também foram observadas pelo padre Azpicueta Navarro ao dizer, segundo as palavras de Laura de Mello, que os Jesuítas escreviam muito sobre a prática do canibalismo.

O discurso de “degração”, feito ao homem da terra, não ficava limitado aos rituais de sacrifício. Outros elementos associavam-se, gerando uma numerosa lista de pecados além do antropofagismo – o incesto, poligamia, nudez, preguiça, cobiça, paganismo. Utilizando os relatos de padre Jerônimo Rodrigues Souza, este nos explicita que havia muitos homens para várias mulheres, assim como muitas mulheres para vários homens. No caso dos homens, estes se apropriavam inclusive das suas filhas e netas como mulheres. Outra análise feita seria, a cerca da preguiça que, debruçando olhares sobre os trabalhos de Prado, remete a uma sombria análise a respeito dos gentios. Em relação a cobiça, esta não caberia ao “negro” da terra, mas sim ao próprio europeu que, ao adentrar estas terras, seria corrompido por ela e sofreria pelo seu pecado.

As análises feitas por vários cronistas da época, e até mesmo pensadores mais contemporâneos como Kant, por exemplo, trazem a lume uma discussão referente à “bestialidade” dos gentios. Tratados como feras, serviram de alimento para o imaginário europeu. Se em 1555 o padre José de Anchieta se comparava a um veterinário, então para ele os índios americanos não passavam de animais. A autora continua avançando, dizendo que todos estes fatores somados sobre o homem da terra deram uma terceira concepção européia a respeito das terras americanas. A permissividade destes homens, devido as suas práticas, levaria o demônio a atuar livremente por estas terras. Uma vez expulso da Europa, devido à ação inquietante da Igreja católica que, segundo a autora, eficazmente cristianizou o continente e se fez vitoriosa durante a alta Idade media. Ao citar D. Rodrigo, Souza procurou embasamento para marcar a terceira fase a respeito do imaginário europeu.
(...) por todo o trajeto, procurou o demônio atrapalhar a viajem; não tendo sucesso, ‘se meteu em uma baleia e tão bravamente nos seguiu pela estreita canoa (...) lancei-lhe um Agnus Dei. Só assim a baleia (demônio) se afastou.
De acordo com estes relatos o demônio poderia estar presente não somente nas práticas indígenas, mas também no comportamento dos animais e nos fenômenos da natureza. Pragas de formigas, pulgas e outros insetos poderiam representar uma reação opressora sobre aqueles homens de Deus que, investidos do poder divino, estariam ali para combater o mal e evangelizar os “bárbaros”. Na passagem de Frei Vicente, ao celebrar uma missa, “o Satanás se fez presente transformando um belo dia claro em uma tempestade de raios e relâmpagos, que não só molhou os clérigos como também derrubou a imagem de Nossa Senhora ao chão”. No dia seguinte a este fato, segue o relato, Satanás fez acumular uma praga de moscas que assolou completamente o local.

Podemos então perceber que a visão edênica se dá pela natureza exótica que, em um primeiro momento, teria sido as Índias. Já a visão de inferno ocorre através dos fenômenos da natureza. É nessa dicotomia Céu e Inferno que se criou a necessidade de um Purgatório nas colônias européias das Américas. No século XVI, segundo Souza, o juiz demonólogo De Lancre via a incerteza, o afastamento e a confiança no abstrato entre outros como elementos capazes de provocar um efeito de afastamento do homem com Deus. De certa maneira o mar foi o objeto transformador nesse processo imaginário. Não que a idéia de Purgatório fosse algo de novo no consciente do europeu, mas segundo a autora, houve uma reformulação da “idéia de Purgatório” que de uma forma ou de outra, se adaptou muito bem a realidade das “terras de aça”. Como já observamos, tal visão se deu sob vários aspectos e em vários períodos. O “mar demoníaco” de De lancre no século XVI, sob condições bem semelhantes, será o “mar demoníaco de Camões do século XVIII, que fará do marinheiro o “prisioneiro da passagem”. A visão de mundo assombrado das colônias americanas lidavam com o mar como uma travessia para o além. Conscientemente ou não, esta era uma visão dos povos de origem africana, com quais, os europeus já tinha tido contato. As dificuldades passadas nas colônias pela vida rude não só reproduzia o imaginário europeu, como servia de castigo para os pecadores.

A visão de purgatório vai servir como uma solução para dois principais aspectos. O primeiro teria sido o social, como por exemplo, para onde iriam os condenados ao degredo Português. Para os espanhóis a colônia foi o paraíso local capaz de purificar as almas. As colônias européias nas Américas passaram a ser o lugar dos renegados. O segundo fora o econômico, já que a colônia precisava, acima de tudo, produzir para a metrópole. Então coube a esse degredado ser a mão-de-obra necessária para que homens na forma de trabalhadores, em sua maioria compulsórios, pudessem se purificar dos seus pecados. O discurso utilizado foi de grande eficiência, capaz de criar um equilíbrio entre metrópole e colônia.

As três visões sobre o imaginário europeu a respeito das terras portuguesas e espanholas nas Américas foram produtos de um imaginário que estava intrinsecamente influenciado por um aculturamento do imaginário acidental. Tendo sido bastante eficaz na construção do “Novo Mundo”.