terça-feira, 30 de abril de 2013

A questão do Feriadão

O Brasil é o país dos feriados! Várias vezes já ouvi pessoas afirmando tal fato, até porque qualquer paralisação mexe com os setores que trabalham com produtividade. Os patrões, por exemplo, veem as longas folgas como fator de prejuízo, enquanto os trabalhadores são fãs incondicionais das paradas, pois apreciam ficar em casa, descansando “um pouquinho”, pois ninguém é de ferro e relaxar faz bem para o corpo e para o espírito, ou recebem horas extras caso trabalhem. Se formos comparar com as economias mais modernas, veremos que o Brasil nem tem tantos feriados nacionais (excluo aqui os estaduais e municipais). Levantamento do site feriados.net contabiliza que o Brasil tem oito dias de feriado nacional; enquanto a Alemanha tem nove; os Estados Unidos, dez; a Espanha, 11; a Argentina, 13; Portugal, 14; e Japão, 16. Além de menos feriados que os demais países, o brasileiro tem carga de trabalho maior do que de trabalhadores de outros países. “A carga de trabalho no Brasil é uma das mais elevadas no mundo. Nós temos uma jornada de 44 horas, que país civilizado nenhum do mundo tem praticado mais ”, destacou Evilásio Salvador, assessor de Política Fiscal e Orçamentária do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) . Portanto não custa fazer a sua análise e verificar o que deve ser modificado ou não. Desde o último dia 15 de novembro, data em que se comemora a Proclamação da República no Brasil, muita gente está curtindo seis dias de folga. Não digo que todos estão aproveitando porque ainda existem aqueles que não têm esta facilidade em suas vidas, olham até com algum ciúme os que não estão fazendo nada em suas vidas. Entretanto vale a pena refletirmos um pouco sobre os últimos dias, começando justamente pelos eventos que modificaram a história e o regime político do país. A monarquia brasileira teve seu início após a Independência do Brasil em relação a Portugal no dia 7 de setembro de 1822. Somando os dois governos imperiais e a Regência (1831-1840), vivemos sessenta e sete anos procurando uma afirmação como nação frente aos outros países americanos que já viviam a república, com seus problemas particulares é claro, alguns nem melhores ou piores que nós. De fato, ao chegarmos ao final da década de 1880, em um processo que já se arrastava há um bom tempo, o governo imperial de sua Majestade Dom Pedro II (permitam-me abreviar o nome, grande demais para caber em qualquer lugar...), já andava mal das pernas, sem prestígio algum frente às elites (que desde sempre apoiaram os governos, enquanto as outras classes só obedeciam a tudo), sem moral com os militares e sem forças para modificar qualquer panorama, ainda mais após a ratificação feita pela princesa Isabel em relação aos escravos. Exatamente, ela confirmou a liberdade que já vinha acontecendo em muitos lugares do país, o que não quer dizer que tal gesto deva ser diminuído, o que claramente desagradou aos grandes latifundiários, base da sociedade escravista, que passou a apoiar os ideais republicanos. Dezoito meses depois um golpe de estado promovido por militares e civis, deu fim ao Império brasileiro, confirmando a vitória do Partido Republicano sobre um governo que não possuía mais base alguma. Várias vezes já foi dito que não houve participação popular nos eventos citados, pois de acordo com Aristides Lobo (que após a proclamação foi Ministro do Interior por dois meses), “o povo assistiu àquilo bestializado, atônito, surpreso, sem conhecer o que significava” (sugiro a leitura do livro o Livro Os Bestializados, de José Murilo de Carvalho, para entender melhor o que digo)). Assim nasceu a República no Brasil e sobre “ela” falarei em outra oportunidade. Sobre o 19 de novembro, dia da Bandeira, ainda que não seja feriado, tem sua importância pois foi nesta data que ocorreu a instituição da bandeira nacional republicana em 1889, apenas quatro dias após a proclamação. Lembro-me que na minha infância (nasci durante a Ditadura Militar no Brasil) era comum cantarmos perfilados no pátio da escola o Hino Nacional e o Hino à Bandeira (Salve lindo pendão da esperança, salve símbolo augusto da paz...). Eu e os colegas enchíamos o peito para cantar, incentivados pelas professoras, numa demonstração clara de amor ao país, coisas daquela época de ufanismo sem medida. Guardadas as devidas proporções, é incrível a ignorância da juventude atual com relação a esta data. Por último chegamos ao dia 20 de novembro, feriado decretado deveras recentemente, a partir de 1999 no município do Rio de Janeiro, mais que já era comemorado desde o início da década de 1970. A data foi escolhida justamente por ter sido o dia em que Zumbi dos Palmares, símbolo da resistência negra ao regime escravocrata, foi assassinado, em 1695. Seu objetivo é fazer refletir sobre a inserção do negro na sociedade brasileira e sobre a questão da igualdade racial. Mesmo sem ser um feriado nacional, não custa lembrar que Zumbi, segundo a historiografia oficial, foi um grande líder do Quilombo de Palmares (era sobrinho de Ganga Zumba, outro líder local), que lutou pela liberdade e é visto como símbolo da luta travada pelos cativos na época do Brasil colonial. Particularmente, ainda que o governo adote a data como Dia Nacional da Consciência Negra, todos nós que somos descendentes das três etnias, branca, indígena e africana (e também dos asiáticos que vieram depois), devemos parar e pensar no verdadeiro significado da palavra Liberdade, algo que na correria do cotidiano de nossas vidas, pareça ser apenas algo a mais. E lá se vai mais um feriadão, que somente serve para descanso e curtição, jamais para a reflexão de qualquer fato. E confirmo isso com as palavras de um aluno meu que afirmou o seguinte: “Aí profê (sic), zumbi pra mim só aqueles dos filmes Resident Evil, que são maneiro prá”... (prefiro não repetir o adjetivo aqui, apesar de utilizá-lo também, principalmente para os metidos a engraçadinhos). Até a próxima.

O DIA 7 DE SETEMBRO NA HISTÓRIA

Sobre o 7 de setembro, Independência do Brasil. Vamos refletir um pouco este fato? O mês de setembro mal começa e imediatamente nos vemos diante da semana da independência, ainda destacada de alguma forma nos meios de comunicação, o que faz com que lembremos dos acontecimentos que levaram o então príncipe regente, D. Pedro de Alcântara, a quebrar o vínculo que unia o território brasileiro ao Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves (1815-1822), pondo fim a trezentos e vinte e dois anos de exploração. Este ano comemoram-se os 190 anos da Independência do Brasil, o que já me faz antever, se é que isso tem algum sentido, os festejos que certamente acontecerão em 2022, quanto celebraremos o bicentenário da independência. Veremos quando a data chegar! Como não podemos tratar os eventos históricos como fatos que se esgotam em si mesmos, vamos contextualizar a Independência do Brasil, levantando algumas questões interessantes. A história oficial (podemos também chamá-la de historiografia clássica do país) aponta o dia 7 de setembro de 1822 como o dia da Independência. Entretanto alguns historiadores modernos seguem uma linha diferente (e eu concordo), apontando o início do processo alguns anos antes, com a chegada da Família Real portuguesa ao Brasil em 1808, como consequência da Guerra Peninsular movida por Napoleão Bonaparte, que havia invadido Portugal (as tais Guerras Napoleônicas que também afetaram a Espanha) com um exército comandado pelo general Junot. Como a administração do reino português foi transferida para o Brasil, houve um raro caso de “inversão metropolitana”, pois o Brasil passava de mera colônia a sede do governo, exercendo as funções de metrópole, ou seja, o “aparelho de estatal português” passou a atuar a partir do Brasil. Em Portugal houve um grande descontentamento com tal situação, o que levou alguns anos depois a Revolução Liberal do Porto, em agosto de 1820, assunto que trataremos mais adiante. A chegada da família real portuguesa no Brasil marcou fortemente os destinos do Brasil. Pela primeira vez na história, um monarca europeu transferia a capital de seu governo para uma colônia. A escolta foi feita por navios ingleses e cerca de 10 mil pessoas fizeram a viagem que atravessou o oceano Atlântico (ainda hoje há uma divergência em relação ao número de pessoas que vieram realmente). Após vários inconvenientes durante a viagem, uma tempestade separou o comboio de embarcações, fazendo com que D. João e parte da comitiva aportassem primeiro na Bahia, enquanto outros barcos seguiam direto para o Rio de Janeiro. Os britânicos imaginavam que a proteção dada a Família Real e a defesa das terras portuguesas da invasão napoleônica lhes dariam vantagens econômicas em troca do apoio oferecido (e tinham razão). Em Salvador, D. João, orientado pelo economista Luz José da Silva Lisboa, constituiu a Carta Régia de 1808, formalizando a abertura dos portos a “todas as nações amigas” (leia-se corretamente: Inglaterra!). Com esta medida o antigo pacto colonial (que obrigava o Brasil a comercializar apenas com Lisboa, que detinha o monopólio da importação de matérias-primas) era formalmente extinto, o que deu uma outra dinâmica econômica a então colônia portuguesa. A partir de 1810 os Tratados de Aliança e Amizade e de Comércio e Navegação, fixaram interesses britânicos maiores junto ao mercado brasileiro, estabelecendo taxas alfandegárias preferenciais aos produtos ingleses (pois é, a exploração sempre aconteceu, caso ainda haja alguma dúvida). No ano de 1815 D. João elevou o Brasil à condição de Reino Unido de Portugal e Algarves e essa nova nomeação extinguiu politicamente a antiga condição colonial do Brasil. Em 20 de março de 1816 faleceu a rainha Dona Maria I, o que deu ao regente a condição de assumir “de fato” o trono português que ele já comandava desde 1799. Não demorou para que os lusitanos que permaneceram em Portugal se mostrassem cada vez mais descontentes com o “status” que o Brasil alcançava como sede administrativa do governo português. Por isso em 1820 um movimento revolucionário das cortes de Lisboa lutou pelo fim da condição política que deixava de Portugal em segundo plano. A chamada Revolução do Porto tratou de criar um governo provisório, exigindo o retorno imediato de Dom João VI à antiga metrópole lisboeta. Como o rei temia perder o seu poder, partiu para a Europa em 25 de abril de 1821, após treze anos morando aqui, não sem antes deixar seu filho primogênito, Dom Pedro, como príncipe regente do Brasil, com a seguinte recomendação: “Se o Brasil for se separar de Portugal, antes seja para ti, que me hás de respeitar, do que para algum desses aventureiros”. Acredito que D. João já antevia o que acabou realmente tornando-se verdade. Fez uma espécie de “arranjo” para o filho e impulsionou a ideia separatista. Os revolucionários, por sua vez, exigiram a volta do pacto colonial, o que significava a recolonização do Brasil, fazendo com que as repercussões desses acontecimentos fossem as mais negativas do lado de cá do Atlântico, o que não tardou a impulsionar formação de um movimento que influenciaria a independência do Brasil. Os deputados portugueses também fizeram chegar por aqui, em 9 de dezembro do mesmo ano, os decretos das Cortes que determinavam a abolição da Regência e o imediato retorno de D. Pedro de Alcântara a Portugal, a obediência das províncias a Lisboa (e não mais ao Rio de Janeiro) e a extinção dos tribunais do Rio de Janeiro. O Príncipe Regente até começou a preparar-se para o seu regresso, mas a partir daquele momento os fatos subsequentes trataram de dar novo rumo à história. O príncipe não só desobedeceu a ordem da Cortes, como também pronunciou a célebre frase “Se é para o bem de todos e felicidade geral da Nação, estou pronto. Digam ao povo que fico!”. O episódio tornou-se conhecido como “Dia do Fico”, o que atendia a um documento assinado por pessoas da elite brasileira (ninguém pode pensar que todos desejavam que o príncipe ficasse, uma vez que os pobres, indígenas, escravos e outros não participaram diretamente do evento, muito menos assinaram coisa alguma, pois faziam parte da grande massa de analfabetos existentes por aqui naquela época). Em agosto de 1822 D. Pedro foi à província de São Paulo com o intuito de dar fim a uma rebelião contra José Bonifácio de Andrada e Silva, que ocupava o cargo de ministro do Reino e dos Estrangeiros. Segundo alguns registros foi nesta época que ele conheceu uma de suas mais famosas amantes, Domitila de Castro do Canto e Melo (futura Marquesa de Santos a partir de 1826). No dia 7 de setembro, quando voltava de Santos, D. Pedro e demais membros da tropa apearam às margens do riacho do Ipiranga, quando duas correspondências enviadas por José Bonifácio e sua esposa, Maria Leopoldina aconselhavam-no a romper com Portugal. Devido a estas circunstâncias, já não desejando seguir quaisquer ordens vindas de Lisboa, D. Pedro, movido por um heroísmo sem limites (imortalizado no quadro do pintor Pedro Américo), proferiu a célebre frase “Independência ou Morte!”, rompendo os laços da já frágil união política do Brasil com Portugal. O longo processo da emancipação foi ratificado com a aclamação do príncipe como Imperador, com o título de D. Pedro I, defensor perpétuo do Brasil, sendo sagrado e coroado solenemente em 1º de dezembro de 1822. Muito bem, reconheço que a explanação foi longa, mas posso garantir que é “apenas” um resumo dos fatos. O caro leitor não pode pensar que acaba por aqui a bela história... Deixe-me contar alguns dos fatos posteriores à independência! O surgimento do Primeiro Reinado marcou decisivamente a renúncia da condição de colônia e a transformação do Brasil em uma nação politicamente soberana. Sabemos do significado histórico dessa mudança, porém nosso processo emancipatório não deu margem à conquista de outras alterações mais extensas e significativas. Não devemos esquecer que os privilégios das classes dominantes e a condição de miséria de todos os subordinados (aqueles que já citei) foram explicitamente preservados. A Assembleia Constituinte reuniu-se em 1823 e seu principal objetivo era a elaboração da primeira Constituição do Brasil, ou seja, as leis que assegurariam os direitos do governo e da população brasileira. Entretanto apenas os membros da elite (latifundiários, ricos comerciantes, militares e outros...) trabalharam na elaboração da Constituição de 1824. Essa constituição tinha um caráter elitista e excludente, pois dava total poder a D. Pedro I, enquanto o direito de votar e de se candidatar a algum cargo eletivo ficaria restrito a quem tivesse uma renda mínima por ano. Preciso dizer novamente que os pobres, indígenas, escravos e outros menos afortunados ficaram de fora? Se você disse sim, acertou em cheio. O que aconteceu na verdade foi uma independência sem muitas mudanças no quadro político e social do país. Daí para frente o Imperador apoiou-se em grandes empréstimos contraídos junto à Inglaterra para poder acertar as dispendiosas contas criadas pela máquina estatal brasileira, o que nos leva a conclusão que deixamos de ser dependentes de Portugal para ficarmos reféns dos interesses ingleses sobre a nova nação, situação que aliás entendeu-se ao longo do século XIX. A popularidade de D. Pedro I foi caindo com o passar dos anos, mesmo junto às elites que apoiaram seus atos no início do governo, culminando com sua abdicação em 1831, apenas nove anos depois da independência. Passados tantos anos, com o fim do império e início da República, depois de tantos problemas que enfrentamos em nossa história recente (ditadura militar, impeachment, neoliberalismo, mensalão, falência das principais bases socias e descrédito na classe política atual, só para citar alguns casos) eu pergunto a você: Podemos realmente comemorar uma independência verdadeira? Este é um país que honra seus compromissos sociais e morais? Somos nacionalistas de verdade ou apenas aproveitamos o feriado para descansar e viajar? Não bastam os desfiles militares para comemorarmos uma das datas nacionais mais importantes da nação brasileira, porque nem eu e nem ninguém que eu conheça agita a bandeira nacional no dia da pátria. Aliás, sobre o conceito de Nação e nacionalidade, melhor deixar para um futuro artigo. Por enquanto continuarei pensando apenas na “Independência do Brasil”...